Pecuária ressente-se do efeito das mudanças climáticas em Magude – diz aministrador

Com parte das regiões Sul e Centro sob ameaças de seca, devido ao El-niño, a Revista Terra esteve no distrito de Magude, um dos locais que mais sentiu o impacto deste fenómeno climático, durante a sua recente influência no país, para uma entrevista com o administrador local, Lázaro Bambamba.  A experiência do distrito para lidar com aquele fenómeno, que já começou a ter nova vaga no país, foi um dos principais tópicos da conversa que segue.

Chegou a Magude em 2016. Como é que encontrou o distrito ao nível agro-pecuário?

Em 2016, aquando da nossa chegada o distrito estava sobre forte influência do El-Niño caracterizado por um longo período de estiagem, com efeito devastador sobre o bem-estar das populações (stress alimentar), devido a baixo nível de produção agrícola nas culturas de primeira época (principalmente o milho) e sobre os animais (perda excessiva da condição corporal).

Esta situação obrigou a esforços no sentido de busca de soluções urgentes de nível técnico e financeiro; Monitorias constantes sobre a situação do stress alimentar; Sensibilização das comunidades no cultivo em zonas baixas e aumento de perímetro irrigada; Produção e armazenamento de feno; Montagem de bancos forrageiros; Introdução de machos melhorados com vista a aumentar o peso de carcaça ao abate; Monitorias constantes da sanidade animal; Reabilitação das infra-estruturas pecuárias (tanques carracicidas) e construção de corredores de tratamento de gado.

Tendo em conta o que produzia nessa altura e a demanda, em termos de consumo local, o que é que significava em termos de auto-suficiência alimentar e como é que o distrito está hoje nestas variantes.

No que concerne a demanda dos mercados locais podemos afirmar que nos anos passados o abastecimento dos produtos de primeira necessidade dependia de retalhistas que adquiriram estes produtos nos distritos vizinho da Macia ou na cidade de Maputo, facto que impactava directamente no preço da aquisição. Nesta altura o distrito conta com dois grandes grossistas que abastecem o mercado local evitando, desta forma, preços altos de aquisição dos mesmos e ruptura de stock. Em relação às hortícolas, era frequente ver as nossas mães nos transportes semi-colectivo a transportar estes produtos do Zímpeto (município de Maputo) para o distrito, mas, neste momento, estes são adquiridos localmente e o excedente abastece mercados dos distritos vizinhos.

Em termos de contributo para a economia local o que é que era quando chegou e o que é actualmente.

Magude é um distrito rural e dependente, basicamente, da pecuária (criação de gado) e agricultura (produção de cana). E estes foram os dois grandes pilares da economia local e, nos anos que cá chegámos, estes estavam severamente afectados pelo fenómeno El-niño.

O grande desafio foi sempre melhorar os ganhos económicos nestes dois pilares (pecuária e agricultura) com o incentivo no investimento na cadeia de valores das carnes vermelhas.

O distrito recebeu um novo matadouro moderno e equipado com tecnologia de ponta para o abate e processamento da carnes; recebeu investimento em reabilitação e construção de infra-estruturas pecuárias, nomeadamente, quatro tanques carracicidas, 14 corredores de tratamento e duas feiras de comercialização de gado.

Nos anos de 2018 e 2019 foram fomentados 200 bovinos de raça Angoni, com o objectivo de repovoamento. No ano de 2023 foram fomentados 18 bovinos de raça Bonsmare cujo objectivo é garantir o melhoramento genético (aumento de peso da carcaça ao abate) nas comunidades beneficiárias.

Neste quinquénio – 2020-2024 – Magude beneficiou das fases 1 e 2 do Projecto de Resiliência a Seca do INGD, com financiamento do BAD, que consistiu na construção de oito Reservatórios Escavados para o abeberamento do gado bovino, produção de pequenas hortas e consumo humano, usando certeza. É investimento com grande impacto na vida da nossa população, considerando que Magude é um distrito semi-árido.

Quero igualmente falar da reabilitação da represa de Matongomane, no Posto Administrativo de Mahel, no âmbito da Iniciativa Presidencial PRAVIDA. Outrossim, nestes anos houve também uma grande tendência na diversificação da economia local, com o investimento na área de serviços.

Duas grandes empresas de comércio a grosso, duas estações de serviços, três estâncias de alojamento e similares, uma serigrafia, uma Escola Secundária Comunitária (Albert Einstein), dois institutos técnicos médios que, ambos, leccionam 500 estudantes por ano, uma indústria panificadora com capacidade para produzir sete mil pães por dia e uma creche, só para citar alguns exemplos.

O distrito está também a se posicionar na produção de peixe em cativeiro, sendo ainda uma actividade na fase inicial, mas que se está a evidenciar e a conquistar novos investimentos, deixando boas promessas para os próximos anos. Igualmente, estamos a preparar Magude para ter lugar de destaque no ecoturismo, no Posto Administrativo de Mapulanguene, com as empresas Karingane Game Reserve e Sabié Game Park e esperamos que neste ano de 2024 possamos dar bons passos nesta área.

Ao nível de produção agrícola, quais são os produtos que continuam a ser de bandeira.

Os produtos bandeira do distrito são: carnes vermelhas e cana de açúcar- cultura de exportação.

A açucareira de Xinavane, maior entidade agrária posicionada mesmo à entrada do distrito, vezes houve que teve uma relação azeda com as comunidades de Magude. Como é que caracteriza a situação nesta altura e como é que se chega a este estágio actual.

A relação à açucareira de Xinavane (distrito da Manhiça) e as comunidades de Magude têm registado muitas melhorias. Há já momentos de diálogo constantes e a comunidade tem percebido o benefício de companhia em Magude, visto que contribui bastante em número de emprego criados (variando mas nunca menos de 1000) e o facto das associações e produtores privados poderem vender a sua produção de cana- de- açúcar, estimado em mais de 1,2 milhões de toneladas anuais, e com isso gerar renda.

O roubo de gado sempre foi um dos grandes problemas no distrito. Como é que estava a situação quando chegou e como é que está actualmente. Em relação ao roubo de gado há tendência a redução, devido ao trabalho conjunto entre Associação de Criadores de Gado, SDAE (Secretaria Distrital de Actividades Económicas) e PRM (Polícia da República de Moçambique).

Quais foram as medidas tomadas para estancar o problema.

A estratégia usada é que há uma obrigatoriedade de todo criador ter os seus animais marcados com a marca individual para poderem circular. No local de origem dos animais, há uma declaração emitida pela associação (Magude possui 14 associações de criadores) e um recibo emitido pela autoridade pelo Posto Administrativo, confirmando conhecer o curral de onde saem esses animais.

A feira da carne tem sido um dos principais cartões de visita do distrito. Qual tem sido o nível de abate e de contribuição nas receitas.

O Festival de carne já teve cinco edições e sofreu interrupção nos anos da Covid-19. É um evento que mobiliza grandes massas para o distrito, o que impacta sobremaneira na economia local. A título de exemplo, só na última edição foram vendidos cerca de 25 toneladas de carne em dois dias. Somando os ganhos de todos os sectores envolvidos (criadores, matadouros, talhantes, feirantes, hotelaria e similares) o ganho foi em torno de 10 milhões de meticais nos dois dias.

Numa altura em que as mudanças climáticas são uma realidade cada vez mais penosa para o país, no geral, qual tem sido o impacto ao nível do distrito de Magude, incluindo no sector agro- pecuário.

No sector da pecuária as mudanças climáticas impactam negativamente, com maior incidência de doenças transmitidas por carraças e parasitoses gastro-intestinais, que baixa a produção de leite.
Na agricultura tem impactado com as inundações dos campos no leito do rio Incomáti, resultantes da subida do
caudal dos rios à montante, o que causa a intransitabilidade de algumas vias, submersão de culturas, equipamentos de rega. Mesmo os campos irrigados, os intervalos de rega são reduzidos devido a taxa da evapotranspiração, o que acaba aumentando o custo de produção.
Na zona alta, registamos vagas de calor, baixa precipitação e, consequentemente, baixa produção, devido aos
índices de satisfação hidrológica das culturas.

Quais são as perspectivas de produção agro-pecuária para esta época em curso.
Para a primeira época 2023/24, perspectiva-se rendimentos médios em quase todo o Distrito, uma vez que nos meses de Novembro e Dezembro, a precipitação registada contribuiu significativamente no desenvolvimento das culturas.
Para pecuária, face às chuvas que caíram, garantiu-se o rebrote e a maior disponibilidade de pasto até aos meses
de Outubro-Novembro, o que contribuirá com aumento de ganho de peso dos animais, melhorando assim a disponibilidade de carne de qualidade.
Face à disponibilidade de pasto, prevê-se a produção de fardos de feno em grandes quantidades para garantir a
suplementação animal. Ainda na mesma senda, os animais irão circular com frequência, consequentemente haverá muitos partos/nascimentos.